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Certas coisas levam tempo



Quis tanto ser teu porto, dar tudo de mim sem me preocupar em receber, estender a mão, ouvir, mesmo quando não tivesse nada interessante a me dizer. Quis tanto que você escutasse a porta se fechar e corresse para não dar tempo. Quis tanto que me telefonasse de madrugada para dizer aquelas palavras que recitamos por dentro, e às vezes escaparam pelo toque. Pelos olhos. Ou então para confessar que sente muito, pelo tempo e por nós dois.

Pedi aos céus que me ajudasse a aceitar o que era meu de fato, sem exigir, sem premeditar ou calcular. Que houvesse qualquer frase de efeito, para não me esquecer como um gole de uísque quente e amargo no fundo do copo. Tudo em vão. Mas desejei tanto ser o lado bom disso tudo, do final do seu dia, até mesmo dos difíceis, que parecem não ter fim. Quis tanto que percebesse que apesar dos pesares, todas nossas voltas, continuamos os mesmos.


Continuo dobrando minha roupa do jeito que não gosta e acordando cedo no domingo para não fazer nada. Ainda faço a mesma medida do café, inteira, para duas canecas bem cheias. Não aprendi a pregar botões e ainda pago por isso. Os mesmos defeitos. Continuo com aquela vontade imensa de te dizer que fui embora mas queria ter ficado, mais um mês ou por toda vida.

Certas coisas levam tempo. Vai demorar para acostumar encher uma taça ao invés de duas. Talvez outra hora volte a ver o amor como uma coisa boa, que nos aquece. Por hora escuto bem alto Caetano cantar “Sonhos” e tomo para mim, tenho certeza que foi feita para esse momento. Por hora desço degrau por degrau, sem olhar, mesmo que esteja com aquela sensação de ter esquecido alguma coisa para trás. Certas coisas levam tempo, mesmo que siga com um sufoco desconhecido, uma coisa amarga por dentro. Mesmo que as horas aparentem não passar... Tempo, certas coisas levam tempo.


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